O tema “paradoxos em organizações burocráticas” é um clássico da teoria das organizações. Paradoxos organizacionais surgem quando duas realidades contraditórias coexistem, apesar de, em teoria, serem mutuamente excludentes.
Paradoxos são comuns em todas as organizações, mas eles se apresentam de forma exacerbada na Finep. A própria empresa é um paradoxo. Somos dedicados ao financiamento da inovação, mas operamos com processos manuais, rigidez imposta pela legislação, e limites à postura inovativa interna.
Nos últimos anos, um paradoxo específico tem se intensificado: o paradoxo discurso versus prática. Este paradoxo reflete a discrepância entre o que a organização proclama e o que ela efetivamente pratica. Esse descompasso gera percepções inconsistentes entre os empregados, que passam a enxergar a realidade por meio de lentes polarizadas, dividindo suas interpretações entre o “discurso” e a “prática.”
Existem inúmeros efeitos negativos desse paradoxo na literatura de gestão[1]. Um dos mais graves é a criação de expectativas que não se concretizam, gerando frustração, tensão e estresse no ambiente organizacional. A deterioração do clima organizacional está diretamente ligada a essas contradições.
Por exemplo, nos últimos dois anos, observamos a retomada dos treinamentos sobre assédio moral e sexual, impulsionados pela Lei 14.540/2023. No entanto, a Finep mantém estruturas, políticas, normas e práticas ineficazes, que resultam em um ambiente onde o assédio é incentivado ao invés de coibido[2][3].
Outro exemplo é o discurso sobre Diversidade, Equidade e Inclusão, que ganhou força recentemente. A realidade mostra uma empresa predominantemente branca e gerida por homens. Adicionalmente, é brutal a disparidade no tratamento entre terceirizados, empregados de nível médio e analistas.
Os terceirizados, que constituem a base da pirâmide, recebem salários equivalentes ao piso das respectivas categorias. Alguns deles nem sequer possuem a proteção de um sindicato.
Os empregados de nível médio, por sua vez, recebem salários desproporcionalmente baixos em comparação aos analistas, em função de uma decisão tomada no passado pela Finep, que decidiu propositalmente pagar mal para essa categoria[4]. Como agravante, a Finep passou a direcionar suas políticas de gestão de pessoas exclusivamente para os analistas, que são mais promovidos, recebem mais treinamento e possuem mais oportunidade de ascensão a cargos e funções comissionadas com boa remuneração.
Não cabe aqui listar todos os problemas que afligem a categoria do nível médio, pois seria necessária uma nota inteira apenas para isso. Contudo, é crucial destacar que a Finep tem negado sistematicamente as demandas relacionadas a essa categoria na mesa de negociação do ACT 2024-2025.
Pior, a Finep entende que não há nenhum problema com a remuneração da categoria, escorando-se no resultado da pesquisa salarial efetuada há alguns anos pela PWC, pesquisa essa que teve os resultados torturados até dizerem o que a Finep queria.
Curiosamente, a gestão anterior da Finep, embora não adotasse discursos grandiosos sobre equidade e inclusão, também não tentava criar uma fachada de cuidado com os empregados. Nesse sentido, havia mais coerência e, até certo ponto, honestidade nas práticas da antiga gestão, pois as expectativas eram claras e não havia promessas vazias.
A Finep precisa ir além das medidas cosméticas e enfrentar de fato os problemas. Não basta pintar as paredes, é necessário consertar o vazamento que está corroendo as fundações da nossa organização. Se isso não for feito, o discurso continuará a ser apenas isso: palavras que, ao invés de motivar, ampliam o desalento e a frustração dos empregados.
Representantes dos Empregados na Mesa de Negociação
[1] VASCONCELOS, I.; MASCARENHAS, A. O.; VASCONCELOS, F. C. DE. Paradoxos organizacionais, gestão de pessoas e tecnologia na Souza Cruz. RAE eletrônica, v. 3, n. 2, dez. 2004.
[2] Website AFIN (disponível em: https://www.afin.org.br/afin-identifica-problemas-nas-questoes-sobre-assedio-moral-ou-sexual-na-finep/).
[3] Website AFIN (disponível em: https://www.afin.org.br/finep-responde-carta-da-afin-sobre-prevencao-e-o-enfrentamento-ao-assedio/).
[4] Carta ao Ministério da Ciência e Tecnologia, de 26 de janeiro de 2011, protocolada sob o nº 001230.